ÁREA
SOCIOCULTURAL KIKONGO (Ver também
DISTRIBUIÇÃO ETNO-LINGUÍSTICA)
NKANGI
KIDITU – CRUCIFIXO – CRUCIFIX
DESIGNAÇÃO:
Nkangi Kiditu
DESCRIÇÃO:
Imagem em metal fundido, encrustrada
em cruz de madeira. Peça muito
antiga
ORIGEM:
Bakongo
FUNÇÃO:
Religiosa
MATÉRIA:
Madeira e ferro
DIMENSÕES:
45 cm x 23 cm
Em observação e análise,
uma peça de carácter
religioso, com perfil marcadamente
aculturado, integrante da área
das representações subjectivas,
na sociedade tradicional Kongo. Este
tipo de escultura, reflecte o resultado
da acção missionária
desenvolvida no antigo Reino do Kongo
em consequência dos "contactos
que passaram a estabelecer-se entre
o Reino do Kongo
e
o Reino de Portugal desde 1484"
(l). De referir que Diogo Cão,
quando chegou a Mbanza Soyo, cidade
costeira do Rio Zaire e mais próxima
do Oceano Atlântico, enviou
emissários da sua tripulação
a fim de entregar presentes ao Manikongo
(soberano do Kongo).
Dos
contactos que passaram a estabelecer-se,
resultou que quando Diogo Cão
regressou a Lisboa, iam na sua tripulação
quatro elementos congoleses, tendo
alguns dos seus homens permanecido
em terras do Manikongo, com o objectivo
de aprenderem a língua e os
costumes daquele Reino. Quinze luas
mais tarde, Diogo Cão regressou
com os quatro africanos que consigo
se tinham deslocado a Lisboa e, nessa
altura, o Manikongo mostrou-se interessado
em estabelecer contactos com os portugueses.
Para vincar esse propósito,
enviou mensageiros seus junto de D.
João II, a fim de fazerem entrega
de um presente, que constava de marfim
e panos de palma.
Esses
emissários levavam ainda a
incumbência de solicitarem ao
Rei de Portugal, o envio de missionários.
O Manikongo
confiou a Diogo Cão a responsabilidade
de levar consigo, alguns jovens com
o objectivo de serem baptizados, e
instruídos na religião
católica. Os jovens foram baptizados
em Portugal, tendo os D. João
II posteriormente enviado para o Kongo."
andou também preparar uma armada,
composta por três navios que
chegaram do Tejo aos 19 de dezembro
de 1490. Nela seguiam missionários,
artífices e instrumentos religiosos
como: retábulos, paramentos,
sinos, pedras de ara, cálices,
missais etc" (2).
Desta
breve descrição, podemos
constatar a longa convivência
e consequentemente a influência
da religião católica
nas sociedades Bakongo. Os efeitos
da aculturação e os
traços marcadamente sincréticos
das manifestações religiosas
que hoje nos são possíveis
observar, demonstram e justificam
a existência de peças
com a configuração da
imagem aqui apresentada.
NDEMBA
– MÁSCARA
DESIGNAÇÃO:
Ndemba
DESCRIÇÃO:
Máscara representando
uma figura humana com gorro em mabela
ornada com barba de ráfia,
pintada de preto, branco, vermelho,
verde e azul
ORIGEM:
Província do Uíge
FUNÇÃO:
Ritual Circuncisão
MATÉRIA:
Madeira e Ráfia
DIMENSÕES:
87 cm
Uma
das características da escultura
kongo é a sua representação
policromática e expressão
profundamente realista. A máscara
Ndemba é uma das mais belas
produções deste grupo
sócio-cultural. Utilizada em
cerimónias rituais da circuncisão,
ela tem como função
testemunhar a transição
dos circuncidados dum estádio
de total ignorância para aquele
dos indivíduos com estatuto
socialmente reconhecido. Como todas
as máscaras utilizadas nos
rituais, a Ndemba é o elemento
intermediário entre o mundo
dos vivos e o mundo dos espíritos.
Através da dança e da
teatrização das cenas
do quotidiano dos seus elementos.
O seu uso é interdito às
mulheres e aos não circuncidados
sob risco de morrerem, uma vez que
quem se encontra nesta situação
é considerado inferior, não
gente, inculto, ignorante dos segredos
da vida.
Ligada
à parte superior da máscara
(a cabeça) existe um fato,
elaborado de vegetais, designado genericamente
por Nkisi Nkanda.
A
circuncisão no seio deste grupo
social, pode acontecer por dois processos:
Loonguae Mahoodi No primeiro processo
a criança do sexo masculino
é internada no campo da circuncisão,
Nkanda, onde permanece de seis a doze
meses. Aí são-lhe ministrados
os ensinamentos da vida quotidiana
e da prática sexual.
No
segundo caso, Mahoodi é um
processo que revela bastante os traços
de um convívio com processos
mais modernizados. A idade em que
a criança é submetida
à operação é
muito inferior e os pais podem intervir
no curativo. Processo condenado nos
meios tradicionais deste grupo social,
invocando o perigo da fraca erecção,
falta de virilidade e esterilidade.
NKISI
KONDE – ESCULTURA EM MADEIRA
DESIGNAÇÃO:
Nkisi Konde
DESCRIÇÃO:
Escultura em madeira cravejada
de pregos com relicário na
parte frontal do
tronco. Usado para invocar espíritos,
receber e sancionar imprecações
ORIGEM:
Cabinda
FUNÇÃO:
Crença e magia
MATÉRIA:
Madeira, pregos e
espelho
DIMENSÕES:
53 cm x 24 cm
Temos
em presença uma escultura originária
do grupo sócio-linguístico
kongo. Este grupo habita principalmente
em toda a faixa Noreste de Angola,
expandindo-se para os território
s vizinhos, outrora áreas integrantes
do antigo Reino do Kongo.
Como
outras similares, esta escultura é
um elemento dinâmico no seu
contexto social. Tem como função
específica, viabilizar os efeitos
pretendidos por um consultante, com
o objectivo de atingir um destinatário,
a vítima. Destina-se a receber
e sancionar imprecações.
Só há um elemento na
estrutura social tradicional, com
poder para produzir tais efeitos,
o Nganga.
Ressalta
de imediato a expressão atemorizante
de toda a escultura, e principalmente
a que reflecte o rosto. O impacto
que ela provoca em qualquer observador
e, mais concretamente, aos elementos
endógenos a este grupo, responde
à função social
desta escultura. Produzida em madeira,
é revestida de uma coloração
branca. Cravejada de pregos, cada
um deles significa uma morte espiritual.
Nos olhos e na região frontal
do tronco, verificam-se partículas
espelhadas. O pedaço colocado
no ventre, tem a função
de reflectir a imagem de quem fez
mal ao consultante, e projectar para
essa pessoa, o mal que lhe era destinado.
Detém ainda, uma concavidade
na região estomacal, o relicário,
onde são depositados os ingredientes
determinados pelo Nganga. Todo o conjunto
de acções ligadas a
esta escultura, são identificadas
por Kindoki. Iremos referir alguns
elementos simbólicos, ligados
à configuração
desta escultura. Ela é elaborada
em madeira, elemento da vida vegetal,
com ligação à
terra (com antepassados mortos), e
ao ar (com espíritos). A árvore
tem um significado especial na cosmologia
Bakongo. Está presente nas
mais diversas manifestações
ligadas às instituições
sociais ocupando a Nsanda um lugar
privilegiado.
Pintada
de branco, esta cor está ligada
aos espíritos. Neste caso,
poderá identificar-se a intenção
de atrair os espíritos. Cravejada
de pregos, utensílio perfurador,
cortante, que provoca a perda do fluido
vital, o sangue, e consequentemente,
ocorre a morte. As partículas
espelhadas podem associar-se à
teoria veiculada por Frazer, no que
se refere à prática
da magia contagiosa ou simpática,
que nos diz que um igual provoca outro
igual ou, por outras palavras, um
efeito assemelha-se à sua causa.
Por outro lado, as coisas que alguma
vez estiveram em contacto, actuam
reciprocamente à distância,
mesmo depois de ter sido cortado todo
o contacto físico.
Esta
escultura, enquanto elemento funcional
do equilíbrio social tradicional
deste grupo sócio-linguístico,
actualizado pelo Nganga, exerce um
papel de interdição,
de inviolabilidade. A atemorização
provocada pela sua expressão,
impõe-se nas sociedades mais
tradicionais, por vias das representações
subjectivas, que têm a ver com
tabus criados e transmitidos em instâncias
rituais tradicionais.
Os
pesquisadores deste domínio,
crenças religiosas, simbolismo,
ou de elementos a ele interligados,
praticam de certo modo a violação
desse segredo, uma vez que fazem incursões
constantes num domínio defendido
e interdito a estranhos. Mas, dar
a conhecer os valores culturais intrínsecos
a uma estrutura social, também
se torna um objectivo sagrado, daí
o desenvolvimento da ciência,
através do conhecimento efectivo
dos valores culturais tradicionais.
BANDA
– BARRETE
DESIGNAÇÃO:
Banda
DESCRIÇÃO:
Barrete em tecido de fibras
vegetais
de embondeiros, ornamentado com garras
de leopardo e/ou leão
ORIGEM:
Kongo
FUNÇÃO:
Simbolo da chefia
(Kimfumu)
MATÉRIA:
Fibra vegetal
DIMENSÕES:
25 cm x 22 cm
Usado
pêlos nobres pagãos e
cristãos nas solenidades. Alguns
nobres entravam com eles postos na
cabeça dentro das igrejas com
grande desagrado dos ministros (sacerdotes).
Isto dava-se quando estava em decadência
a religião cristã.
Estamos
em presença de um comportamento
marcadamente ostensivo, inerente à
condição de igura cimeira
na hierarquia política tradicional,
manifestada pela simples utilização
de um sinal externo, o Banda, que
é um objecto simbólico
na actualização do poder
político tradicional.
Ainda
hoje nos é possível
observar estes sinais externos quando,
em manifestações públicas
os representantes da hierarquia superior
do poder político tradicional
aparecem vestidos a rigor. A peça
Banda é tecida a partir da
fibra de embondeiro, espécie
vegetal muito comum no espaço
geográfico Kongo, elaborada
com um pormenor técnico muito
curioso, produzindo losangos em relevo,
distribuídos simetricamente.
E posteriormente ornamentada com garras
de leopardo e/ou leão, espécies
zoológicas ligadas à
simbologia do poder político
da sociedade kongo.
E
utilizado na cabeça de maneiras
diversas. Dobrado e pousado sobre
o cabelo, enterrado na cabeça
com a aba virada ou não, dobrado
sobre o ombro. A peça Banda
bem como todas as outras inerentes
à actualização
do poder político, é
objecto de tratamento especial no
seio da comunidade, no que se refere
à forma de conservação,
quem as pode manusear, onde é
guardada e, sobretudo, à força
anímica que detém e
transmite aos elementos endógenos
ao grupo.
NTI
A MFUMU – CEPTRO
DESIGNAÇÃO:
Nti A Mfumu
DESCRIÇÃO:
Ceptro em madeira
ORIGEM:
Kongo
FUNÇÃO:
Jurídico Administrativa
MATÉRIA:
Madeira
DIMENSÕES:
96,5 cm
Peça
em pau preto, com formato de bastão.
Decorada em baixo relevo com finuras
geométricas. Em ponta de lança,
nesta peça podem observar-se
três áreas de dimensão
similar, divididas por círculos
bastante convexos que fazem realçar
toda a sua ornamentação.
O Nti A Mfumu constitui um dos três
elementos que simbolizam o poder político
na hierarquia máxima tradicional.
A
natureza joga um papel importante
no imaginário dos Kongo e,
na natureza, a árvore detém
um lugar privilegiado. As fronteiras
entre áreas jurisdicionais
eram demarcadas com uma árvore,
a Nsanda. Esta espécie vegetal
constituía também elemento
indispensável na entronização
do rei, nos conselhos de anciões,
nos julgamentos. A instituição
jurídica, e toda a sua ritualidade,
era fortemente simbolizada com o uso
do Nti A Mfumu. Na abertura da audiência,
o chefe espeta o Nti A Mfumu no chão
e, quando dá por finda a sessão,
procede da mesma forma. A comunidade
kongo detém um elevado sentido
de justiça, sendo indispensável
a consulta aos anciões quando
é caso para tal.
MPUNGI
– ELEFANT-PONTA DE ELEFANTE
DESIGNAÇÃO:
Mpungi
DESCRIÇÃO:
Instrumento musical
elaborado à
partir de ponta de elefante, aerofone,
símbolo de
realeza
ORIGEM:
Bakongo
FUNÇÃO:
Actualização
do poder político
tradicional
MATÉRIA:
Ponta de elefante
DIMENSÕES:
103 cm x 10 cm
Peça
em marfim (ponta de elefante), utilizada
para anunciar mensagens para distâncias
longínquas, ou para entoar
acordes quando o chefe máximo
está presente em ocasiões
ou cerimónias especiais. A
instância máxima do poder
político tradicional (o rei,
seu descendente directo), deve possuir
entre os seus objectos de valor três
Mpungi.
A
cifra três é indispensável
na continuidade da realeza: rei, rainha
e sucessor (filho ou sobrinho). Makukua
Matatu Malambile Kongo, as três
pedras onde assenta a panela, o local
de convívio e troca de ideias.
Tirando uma delas é impossível
cozinhar, porque não há
equilíbrio. Nas cerimónias
que obrigam a presença do rei,
os cânticos são acompanhados
com os três Mpungi. O detentor
dos Mpungi deve cuidá-los com
a maior atenção e deferência,
conservando-os em lugares especiais.
NKALU
A TOMESUA – CABAÇA DECORATIVA
DESIGNAÇÃO:
Nkaiu A Tomeswa
DESCRIÇÃO:
Cabaça pirogravada,
com incisões antropomórficas
e zoomórficas, ornada com figuras
geométricas
ORIGEM:
Província do
Zaire
FUNÇÃO:
Decorativa
MATÉRIA:
Cabaça
DIMENSÕES:
23 cm x 76 cm
Esta
peça, como bem se pode observar
pela imagem, oferece-nos elementos
de apreciação valorativa,
que coloca o seu autor (anónimo)
na classe dos exímios conhecedores
da técnica de pirogravura.
Para além da beleza estética,
ela encerra uma mensagem relacionada
com a vida quotidiana, não
só pelo carácter dos
elementos que compõem a sua
estrutura decorativa (seres humanos,
mundo animal), como também
pelo movimento dinâmico e atitude
decorativa. Nesta cabaça, o
belo tem uma comunicação
directa com o observador, e essa comunicação
manifesta-se na capacidade que tem
de colocar, quem com ela contacta,
perante a emoção estética
do autor, a sua criatividade, e os
sentimentos que exterioriza através
da sua obra.
Por
outro lado, o belo é nos sugerido
pelo contraste da cor, o domínio
da técnica, a suavidade do
traço, a alegria que nos transmite,
em suma, o equilíbrio e harmonia
total dos seus elementos. Esta peça,
que consideramos de carácter
utilitário, com função
decorativa, é uma obra de arte,
e a arte revela a vida afectiva de
quem a produz. Como peça decorativa,
ela responde cabalmente à sua
função.
NHYENDU
– CESTO DORSAL
DESIGNAÇÃO:
Ngyendu
DESCRIÇÃO:
Cesto dorsal com forma cilíndrica,
feito de bordão entremeado
de fibras
vegetais. Tem quatro alças
ORIGEM:
Província do
Uíge
FUNÇÃO:
Transporte de produtos agrícolas
MATÉRIA:
Bordão e fibras vegetais
DIMENSÕES:
52 cm x 43,5 cm
A fabricação desta peça
reporta-nos para as práticas
mais ancestrais adoptadas na funcionalidade
da actividade agrícola. A sua
configuração lembra-nos
o fabrico das mochilas nos tempos
mais actuais.
É um instrumento de apoio à
actividade da mulher na vida quotidiana,
visto que lhe permite transportar
cargas bastante pesadas, em distâncias
por vezes bem longas. É usual
a mulher transportar simultaneamente
no cesto dorsal, a mandioca, outros
tubérculos e productos agrícolas,
a lenha, os instrumentos de trabalho,
água e, eventualmente, transporta
um filho ou dois, se estiver grávida.
O Ngyendu é feito com bordão
de palmeira, entremeado de fibras
vegetais. As quatro alças colocadas
de forma equidistante permitem colocá-lo
às costas, o que alivia o peso
a quem o transporta nas longas distâncias
que, muitas vezes, tem que percorrer.
É uma peça de carácter
utilitário.
NDUNGU
– BATUQUE
DESIGNAÇÃO:
Ndungu
DESCRIÇÃO:
Tambor pequeno de
forma alongada com um tom muito elevado
ORIGEM:
Cabinda
FUNÇÃO:
Instrumento musical simbolizando o
poder do chefe tradicional
MATÉRIA:
Tronco de árvore
e pele de animal
DIMENSÕES:
102 cm (altura)
Instrumento
musical alongado, membranofone, policromático,
apresentando bastantes características
da expressão artística
Kongo. A sua função
e uso estão directamente associadas
ao desenrolar da vida quotidiana da
comunidade, devendo contudo realçar
a sua presença determinante
quer em cerimónias rituais
religiosas, sociais, quer no decorrer
de actividades lúdicas.
Associado
ou não a outros instrumentos,
o Ndungu é o elemento basilar
e impulsionador do ritmo. Está
presente nas mais variadas cerimónias,
imprimindo as nuances do acontecimento
que decorre. Confere e actualiza o
poder político do chefe tradicional
(Soba). Nos julgamentos o tambor serve
de recurso para alcançar a
assistência. A
um toque determinado são repostos
o silêncio e a ordem. Apresentando
configurações diversas,
é fabricado a partir do tronco
escavado de uma árvore. As
aberturas são cobertas de pele,
geralmente de antílope. Há
batuques construídos com uma
só pele (caso do Ndungu), que
pelo seu peso têm que estar
pousados no chão. Outros, com
maior diâmetro e pele nas duas
extremidades, podem ser tocados pendurados
ao pescoço. A variante mais
afunilada e alongada, também
obedece à mesma técnica
de colocação. É,
de uma maneira geral, interdito às
mulheres tocar batuque.
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